Tuesday, November 8, 2011

DECLARAÇÃO DE GUERRA AOS MEUS GATOS

Ao oitavo dia do mês de Novembro de 2011, eu, Saguim, declaro por minha honra a abertura das hostilidades para com os dois demónios felinos que habitam em minha residência sem qualquer abertura a negociações ou a diplomacia. Estou em plena posse das minhas faculdades mentais e perfeitamente consciente de que tal confronto provocará casualidades mas estou disposto a correr o risco, a bem da humanidade, da paz no mundo e dos meus sofás.

Por Marte, deus da guerra, prometo que tombarão em batalha! Ai tombarão tombarão!

Esta Declaração é assim dirigida a dois indivíduos de orelhas triangulares, aqueles que, daqui em diante, apelidarei de meus inimigos mortais... ou mais simplesmente de bandalhos.

a) MARISCO. Pelagem branca e cinzenta. Nariz cor de rosa como o de um porco. Barriga proeminente por enfardar como um bruto a ração que trabalho de sol a sol para lhe comprar. Se pudesse ou soubesse como, tenho a certeza que me arrotaria na cara depois de cada refeição, entre outras coisas piores. Tenho documentos que provam que se trata efectivamente do Anticristo embora o Vaticano não queira, porque tem medo, confirmar esta verdade. É manhoso, o c****o! É manhoso! A sua influência na minha vida é fácil de calcular em euros por tudo aquilo que esfrangalha / avacalha propositadamente. A saber, em jeito de inventário, caso seja no futuro condenado a pagar-me uma qualquer indemnização:


1) A porta da cozinha.

2) Três rolos de papel de cozinha e meio.

3) O sofá da sala.

4) O tapete da sala.

5) O batente da porta da sala.

6) A colcha da cama.

7) O batente da porta do quarto

8) O tapete tunisino que tenho na parede.

9) Um outro tapete, mas agora de rato.

10) O teclado do computador da minha mulher.

11) O cabo do meu disco externo.

12) O cabo do transformador da aparafusadora do IKEA.

13) Um lápis, uma caneta e mais material de escritório diverso.

14) O meu sistema nervoso.


Serve a presente missiva também para alertar acerca das tácticas persuasivas do inimigo. É importante ser impermeável ao ronronar e ao aspecto fofo da besta sempre que está "com soninho e quer colo". A total indiferença a esta estratégia vil atribui à partida uma vantagem de 50% no confronto bélico.


Pontos fortes:

- É notavelmente atlético e rápido.

- Tem garras e dentes que aleijam razoavelmente.

- O seu poder de persuação demoníaca pode influenciar a opinião exterior, nomeadamente vizinhos e familiares.


Pontos fracos:

- É burro.

- Não tem lá muita força.

- É brutalmente curioso, lá está, devido à burrice.


Feito este balanço, a vitória deverá ser garantida dentro de poucas semanas, depois de confrontos que adivinho ferozes. O ordinário é burro, disso não resta a mais pequena dúvida. Qualquer pequeno som ou movimento atraem a sua atenção e conduzem-no aos mais variados perigos como uma flauta de Hamelin. O Natal está próximo e a montagem da árvore não promete nada de bom ou de tranquilo. Aproveitando esse facto, regarei o amontoado de piaçabas verdes a que chamo de pinheiro de Natal com querosene e colocarei um rastilho que acenderei em tempo útil. Atraído pelas faíscas, com aquele ar aparvalhado típico das avestruzes (que também não podem ver nada brilhante) que lhe é característico, estou certo que com sorte terei marisco flambé para a ceia. Cheque-mate, eu ganho.


One down, one to go.


b) JACKIE. Pelagem negra. Espírito gótico e/ou satânico. A maior fabricante de pêlo do mundo em título e a principal responsável pela minha casa parecer, ao final de cada semana, uma casa de alterne romena. Em ruínas. Este é, sem sombra de dúvidas, o adversário mais poderoso e difícil de derrotar. Enquanto que o outro palhaço todos os dias me espanta com a sua estupidez e alegria em ser tão mau, esta destrói-me a alma aos poucos e faz-me questionar acerca da minha própria existência, do meu valor como ser humano. O outro arranha-me a mobília, esta arranha-me a psique. Ah e também aprecia mictar e defecar, chamemos-lhe assim, onde bem lhe apetece. E diz-se ela uma senhora. A saber:


1) No sofá da sala.

2) Na banheira.

3) No sofá do escritório.

4) No chão do escritório.

5) Na minha cama (graças a Deus pela capa de colchão impermeável que a minha santa sogra se lembrou de nos oferecer em tempo útil).


Por causa deste morcego dos infernos somos obrigados a viver numa casa com as portas todas fechadas, como um caixão com assoalhadas. Por causa desta coisa ruim, temos de estar constantemente em sobressalto, a limpar e a desinfectar coisas dos mais variados materiais e tecidos. E até foi por causa deste espírito do mal que decidimos trazer o outro gato lá para casa... E penso que já todos percebemos como é que isso resultou.

A bicha continua a fazer as mesmas trafulhices que fazia antes e talvez até mais. Os dois fuinhas não se dão propriamente mal mas a única forma que têm de interagir ou de "brincar", como certamente pensam naquelas cabecinhas dementes, é de tal forma violenta e abrutalhada que deixou de ser permitido a crianças visitarem a minha casa (atenção, não é que tivesse o hábito de levar crianças para lá, não me interpretem mal).

Entretanto uma amiga nossa enviou-nos uns links na net que provam que o inimigo talvez tenha uma patologia ao nível psicológico. Mas eu acho que isso tudo é treta. Acho que faz tudo parte de um plano pérfido para me expulsar, a mim e à minha mulher, e poder impor finalmente a sua PAX DIABOLICA com muitas missas negras e outras merdas que ela lá quer fazer. No desespero por resolver-lhe o problema e trazer-lhe maior qualidade de vida, acedi até a conceder-lhe um dos quartos que não foi ainda arrumado. Para que pudesse fugir da agitação do outro, tivesse a sua wc privada e pudesse relaxar em sossego. Mas será que isso ajudou? Não! Nunca! Continua a fazer o mesmo e a levar-me aos 80€ de cada vez sempre que vai ao médico. A galdéria!


Pontos fortes:

- Consegue camuflar-se no escuro.

- Tem garras e dentes que aleijam mais do que razoavelmente.

- Não tem compaixão pelos outros seres vivos.


Pontos fracos:

- A sua adoração por biscoitos de gato.

- A dificuldade que terá em aliar-se ao outro, caso fiquem encurralados.

- O seu espírito negro e depressivo, que pode virar-se contra ela.


Feitas as contas, será um adversário bem mais complicado de derrotar mas estou certo que no final a contenda ser-me-á favorável. O outro é pegar-lhe fogo e está o assunto resolvido. Esta terá de provar do seu próprio remédio por todas as vezes que me obrigou, a mim e à minha mulher, a passar noites em claro em busca de uma solução para os seus problemas existenciais, de uma forma milagrosa de lhe trazer felicidade, de aliviar-lhe as maleitas e as feridas na alma. Não, uma maldade assim só pode ser enfrentada pelas mesmas armas!

Tenciono arranjar audiobooks da obra completa do pensador francês Michel Focault, com especial ênfase nos livros "A Sociedade Punitiva", "A Hermenêutica do Sujeito" e "A Microfísica do Poder". Depois deixo-os a tocar em altos berros quando vou trabalhar de manhã, não antes de lhe mijar valentemente na tijela da comida para que saiba o que custa. Tenho a certeza que ao fim da primeira semana, a quantidade de caraminholas que terá na cabeça farão com que finalmente chegue a um ponto de não retorno: tornar-se na gata submissa, pacata e avessa a qualquer coisa que me chateie os cornos que sempre desejei que fosse... ou não aguentar e pôr cobro à sua existência enforcando-se com uma das meias da minha mulher.

Nos dias que correm, qualquer das soluções me serve.

...

Assim sendo, e porque nunca é demais recordar, ao oitavo dia do mês de Novembro de 2011, eu, Saguim, declaro por minha honra a abertura das hostilidades para com os dois demónios felinos que habitam em minha residência.

Agora é só imprimir isto, espalhar pela casa...

... e esperar a porra da retaliação.

Sunday, October 16, 2011

Tudo o que é bom um dia acaba

Tudo o que é bom um dia acaba.

O velho cliché que pode valer para os nossos subsídios de férias e de Natal aplica-se agora às minhas próprias férias. Acabaram e amanhã volto ao trabalho. E não escondo que a ideia de tornar a contribuir para uma economia e para um estado que me rouba como se eu fosse novamente o puto gordo no recreio da escola, não me parece nada apelativa. É que às tantas nem se trata tanto de criminalidade mas mais de bullying, tanto que estou farto de levar na tromba com toda uma panóplia de medidas, percentagens e impostos dos quais muitas vezes nem sequer percebo as siglas. Mas enfim, depois de duas semanas em intenso período de relax acho que não vale a pena estar já a emporcalhar a mente com este tipo de pensamentos e a desafiar o braço esquerdo que começa a formigar...

Não muito depois do nosso super-mentiroso Primeiro Ministro (pronto, lá vou eu outra vez...) anunciar as novas medidas de austeridade, já estava eu a fazer as malas para me fazer à estrada. Na realidade, tudo não passou de uma coincidência mas não escondo que acabou por ser uma p**a de uma coincidência. Enquanto o desgraçado dizia solenemente na TV "Eu peço desculpa mas na realidade nós já não somos tão soberanos quanto eu pensava e agora quem manda é aquela malta que nos quer comprar as empresas, que vamos privatizar à papo-seco, assim a preço de saldo e por isso em vez de tentarmos impulsionar a economia com medidas de incentivo vamos afundá-la ainda mais para enriquecer os nossos donos que detonam isto tudo se não nos portarmos bem..." (talvez não o tenha dito precisamente com estas palavras mas o conteúdo, não me venham com tretas, era este)... Enquanto ele dizia isso eu ouvia "Saguim, minha besta, arruma já os trapos e volta p'ra casa que isto vai ficar pior e ainda te vais arrepender amargamente dos dias que andaste a comer e a beber que nem um porco a sovar! Vá, desanda mazé!" E eu, porque gosto pouco de ouvir falar mal, desandei.

Mas, voltando um pouco atrás... Depois da viagem à Madeira fui passar uns dias a Ferrel, perto do Baleal, uma terra que ficou conhecida porque há uns anos quiseram lá fazer uma central nuclear. Nessa altura, o povo juntou-se para dizer que se fossem p'rá frente com aquilo podiam ter a certeza que iria haver sarrabulho dos antigos. E como o pessoal que usa gravata gosta pouco de sarrabulhos, até porque lhes deixa umas nódoas nas camisas que não saem nem por nada, e preza convenientemente a permanência dos testículos no sítio de origem, desistiu da central nuclear para gáudio dos ferrelenses. Afinal de contas, estavam a lidar com malta que se junta todos os anos para organizar uma corrida de burros à volta da igreja. Portanto, gente que não é p'ra brincadeiras.

Dias bem passados que foram esses, sim senhor...
Mas o grand finale estava para vir em grande estilo: dois dias num Hotel das Caldas de Monchique, daqueles com Spa e tudo. Toma, embrulha e não digas que vens daqui!

Antes demais, convém referir, que este menino que vos escreve NUNCA tinha entrado numa sauna. NUNCA tinha tomado um banho turco. NUNCA tinha levado uma massagem.
E não posso dizer que houvesse uma grande razão para ser assim... Penso que era apenas mais um caso flagrante de falta de categoria. É que eu definitivamente não tenho categoria para essas coisas. Eu é mais bejeca na mão, tremoços no bucho e os argentinos do Benfica a ganhar na TV. Mainada!

Posto isto: óleos relaxantes, piscinas de hidromassagem e ropõezinhos brancos são coisas de rabixo. Mas como também considero que qualquer homem tem direito aos seus momentos mais rabixos, e tendo eu uma mulher ao lado para anular quaisquer conotações menos viris, lá acedi a experimentar.

No entanto, um problema. Ao chegarmos ao Hotel, constatei algo que poderia já ter sido entendido mais cedo caso eu tivesse feito um exercício mental simples.

Termas = Pensionistas

Viram? Eu disse que era simples.

Portanto, só velhos.

Eu não tenho nada contra eles. Até porque, se tiver sorte, mais tarde ou mais cedo farei parte do clube e depois tudo o que não preciso é de uma horda de indivíduos a cravarem-me as dentaduras nos lóbulos das orelhas, como vingança por tudo aquilo que lhes desdisse. Mas enfim, eu ainda estou numa outra fase da vida e custa-me ver um snack-bar a fechar às 17h. É certo e sabido que os pensionistas às 19h já estão a "cabecear" em frente à TV, abençoados sejam, mas eu ainda não. Só a partir das 22h é que penso em aquecer a água para me ir deitar...

Na primeira noite o desafio foi encontrar um sítio para comer. O restaurante do Hotel era um pouco caro demais e, pelas regras instituídas, devia fechar a meio da tarde... Por isso, vimo-nos forçados a encontrar soluções. Estúpido como já me habituei a ser, entrei por uma pensão adentro, a única num raio de 50 km, atraído pelos preços convidativos da carta que se encontrava exposta na rua. Mas quando me deparei com o ambiente tétrico do interior do edifício, ambiente esse que faria o próprio Drácula verter uma gotinha de pânico, e constatando que nenhum ente vivo se encontrava na recepção nem ao seu redor, dei meia volta e regressei para junto da minha mulher que, sempre mais ajuizada do que eu, estava certa que aquela não era uma boa ideia.

Até que surgiu uma pessoa. Do sexo feminino. E me convidou a entrar...

Entre risos e gorgolejos de nervos, lá acedi ao chamamento da "senhora", chamemos-lhe assim, e entrei na sala de refeições, seguido por uma mulher contrariada e lixada da vida por eu ter vergonha de me livrar airosamente de situações como aquela. A sala de jantar era tudo aquilo que se poderia esperar de um sítio como aquele. Mobília escura e antiga, uma enorme e horrenda natureza morta na parede, luz eléctrica a imitar a de velas e apenas duas criaturas, também elas idosas, a acabar a refeição num dos cantos da sala... Ah e música de orgão daquelas dos vampiros a soar não percebi muito bem vinda de onde! Isto, tal qual.

Bom, tentando contrariar a palidez dos nossos rostos, comemos, bebemos, ignorámos um gato assustador que passou o jantar inteiro ao nosso lado a olhar p'ra nós, orámos a Satanás, sacrificámos uma virgem e voltámos para o nosso quarto. Bom, a parte da virgem e do diabo é mentira mas a do gato juro que é verdade. No entanto, estando de férias, tudo é p'ra aceitar com particular ligeireza. Não é um jantar "especial" que marca as nossas férias.

O que marca as nossas férias é mesmo o raio do Spa!

Bom, eu já expliquei que não tenho categoria, que não é a minha praia e essas coisas todas... Portanto já fiz um build-up para aquilo que aí vem. Ao segundo dia nas Caldas de Monchique, eu e a minha mulher marcámos uma massagem para dois, massagem essa que nos dava direito a usufruir do complexo termal. Portanto, de manhãzinha fomos logo p'ra lá. Na piscina estavam duas velhas e um gay, coisa que não me fez sentir particularmente à vontade. Nem a mim nem a eles, diga-se, porque os minutos que se seguiram pautaram por uma série de olhares fixos e de grande estranheza. Dentro da piscina, a velha 1 olhava fixamente para a minha mulher que, por sua vez, olhava fixamente para o vazio. Eu olhava fixamente para a frente, de modo a poder ver toda a gente pelos periféricos e percebia que o gay, por alguma razão bizarra, também olhava fixamente para mim. Isto enquanto a velha 2 olhava fixamente para o gay, talvez porque ele a estivesse a orientar enquanto ela fazia um qualquer exercício de reabilitação, talvez porque fantasiasse acerca de sexo gerontófilo com homossexuais... Enfim, não sei. Isto tudo no mais profundo e desconfortável silêncio. Até eu e a minha mulher decidirmos abandonar o local...

Seguiu-se o banho turco e a sauna. O primeiro mais agradável que o outro, verdade seja dita. Não que eu não tivesse curiosidade de saber o que sentiriam os frangos no interior de um forno (se é que um bicho esfolado e decapitado pode realmente sentir alguma coisa...), mas a ausência de colorau barrado nas minhas costas impediu-me de concretizar a experiência em pleno. Já o banho turco está longe de ser um banho e também não percebo porque lhe chamam turco mas parece-me que resulta. Resultava ainda melhor se a velha 2 da piscina não tivesse vindo atrás de nós, enfiado dentro da cabine connosco e começado a ressonar como um elefante marinho com os copos... Mas ao menos deu-me vontade de repetir.

E foi assim, entre experiências como estas, que chegou o momento da tal massagem.
Momento esse que, convém lembrar, foi também para mim uma primeira vez.

Quando avistei o dueto de massagistas, não vou negar que senti um certo alívio. Temia que fossem homens. Primeiro porque, não sendo de todo homofóbico, há um certo tipo de contacto físico que gosto de evitar com indivíduos do mesmo sexo. E segundo porque também tenho tendência para querer evitar que tenham esse mesmo tipo de contacto com a minha mulher. Assim só p'ra manter as coisas dentro do razoável e do limpinho.

Aproximámo-nos da sala e reparei que uma das massagistas tinha um sorriso significativamente mais aberto do que a outra. Portanto, percebi logo quem é que devia ter perdido a aposta e ficado comigo.

A massagem era de corpo inteiro e a menina achou boa ideia colocar-me duas coisas, que não cheguei a perceber o que eram, nos olhos. Lembrei-me dos romanos que colocavam moedas nos olhos dos mortos para os gajos darem ao barqueiro que os levava para o inferno ou lá o que era... Mas duvido bastante que uma coisa tivesse a ver com a outra. Imagino que fossem pétalas ou algo do género... O que devia dar-me um ar ainda menos digno, deitado naquela marquesa. Mas adiante...

Depois, a mulher colocou-me uma almofada por baixo das pernas para facilitar o seu trabalho. E foi aqui que começaram os meus problemas. Uma pessoa normal tem os pés p'rá frente. Um tipo como eu tem os pés pr'a fora à Charlot. Portanto, o que tínhamos agora era um indivíduo anafado (penso que podemos dizer assim) vestido com uns calções de banho com flores à havaiana, pétalas nos olhos e as pernas abertas elevadas e pés p'ra fora como se estivesse a dar à luz. E era esperado que eu relaxasse e ignorasse tudo isto.

Escusado será dizer que estava uma pilha.
Os pensamentos a sucederem-se a mil à hora.

Quando a massagista começou a mexer-me nos pés lembrei-me que teria sido boa ideia ter cortado as unhas no dia anterior. Tinha aparado as das mãos mas (que raio, estava de férias!) a preguiça impedira-me de fazer o mesmo com as outras. Penso que esta situação não fez maravilhas pelo trabalho da massagista que usava toda a sua destreza para conseguir cumprir a tarefa sem se cortar e apanhar tétano. Dedilhava como uma pianista russa enquanto eu procurava protegê-la, afastando tanto quanto possível as garras das suas mãos.

O resto do tempo, não posso dizer que tenha corrido mal. Fui untado dos pés à cabeça como uma enguia de escabeche, e massajado com todas as forças que a mulher tinha para atacar um corpo como este. Não se saiu mal mas digamos que para ela o dia de trabalho deve ter acabado por ali...

No final, disse-me docemente ao ouvido que a massagem tinha terminado e que podia levantar-me ao meu ritmo. Eu, como o meu ritmo é sempre... Como é que se diz... Ah sim, aparvalhado e à bruta, levantei-me para o lado errado da marquesa, aquele onde não estavam os meus chinelos, coisa que podia ter-me saído muito cara. A mim e ao reconstrutor facial da massagista que estava do outro lado.

Ora, esquecendo-me que estava coberto de óleo e portanto escorregadio como aquele americano que foi preso em Sintra, foi num misto de desequilíbrio e de passos de dança à Fred Astaire (se o Fred Astaire fosse bêbado) que fiz a viagem de 180º até aos chinelos, quase, QUASE, esbardalhando-me para cima da pobre massagista.

Ao recuperar a compostura, e perante o olhar de pânico da jovem, disse que até tinha ficado tonto perante o brilhantismo da sua massagem e saí dali p'ra fora, rumo ao quarto do Hotel.

Enfim...

São estas as memórias que levo para o retomar da labuta, do lufa-lufa do dia-a-dia e dos assaltos à mão armada do nosso Primeiro Ministro (que sabe bem o que isso é porque desde os seus tenros 37 aninhos que anda a papar filmes semelhantes no mercado de trabalho). E não são memórias nada más, atendendo àquilo que espera a maioria dos portugueses.

A verdade é que o Natal já não é p'ra todos.
Assim como não é p'ra todos ter um Ângelo Correia como anjinho da guarda (ai o braço esquerdo...)! Mas é em alturas como estas que temos de aprender a patinar, nem que alarvemente... Contrariar o visco e o sebum dos mentirosos e dos corruptos...

Para tentar chegar, sãos e salvos...

... ao grande par de chinelos...

Que é a felicidade.

Friday, October 7, 2011

Prá frente, sempre!

Ora então, dei por mim e estava visivelmente cansado...

Depois de meses e meses a labutar como uma criança de cinco anos no Bangladesh, concluí que precisava mesmo de um merecido período de férias. E daqueles longe da internet, do telemóvel e até da TV e da Playstation... Absolutamente nada a povoar a minha imaginação além dos meus próprios pensamentos dementes. No fundo, aquilo que o meu corpo e mente exigiam era o mais inócuo e sepulcral sossego, daqueles que só a gruta mais inóspita, o buraco mais denso e profundo conseguem proporcionar. Portanto, acabei por ir prá Madeira.

Não que seja a altura mais pacata para lá ir... Sei bem que não é.
Depois da descoberta da dívida que o Governo Regional acumulou durante uma catrefada de anos, e até tentou encobrir no início do levantar deste processo manhoso, dia sim dia não o Alberto João decide vir berrar qualquer disparate em público como mais uma tentativa de atirar areia para os olhos daquela gente... E atenção que isso é coisa para aleijar! Durante a minha estadia percebi que a areia na Madeira é preta e grossa como um comboio na linha de Sintra. Mas enfim, o homem berra como se não houvesse amanhã e nem sequer está muito enervado quando o faz. Berra porque é assim que ele comunica. Ele e todos os que sofrem do conhecido síndrome de Valentim Loureiro, claro. Por um lado, não há dúvida que AJ tem as suas falências mas por outro também é certo que realizou obra por toda a ilha. Eu continuo a duvidar bastante que tenha sido ele a acartar o cimento e a tijoleira pelos montes e vales mas enfim... Que o homem tem a educação de um trolha lá isso tem.

Mas a verdade é que é raro o estabelecimento ou o edifício que não tenha à porta uma placa a dizer que foi inaugurado no dia tal do ano tal pelo ilustre presidente do Governo Regional da Madeira. Estas placas são às pazadas. Tanto que a dada altura até fiquei surpreendido por não ver miúdas também elas com placas ao pescoço a dizer que foram inauguradas aos dezoito anos por AJ. Certamente que vontade não lhe havia de faltar.

Bom, mas voltemos à Madeira propriamente dita... É muito bela, não haja dúvida.

Tem um grande inconveniente. Toda a ilha apresenta um declive de, mais ou menos, 90º. E é sempre a subir.

Lá, não se passeia. Quanto muito escala-se.

Os Madeirenses têm as suas panças, sim senhor. Gorduras a adejar debaixo dos braços, ora muito bem. Mas todos ostentam uns gémeos tão sólidos e definidos que fariam Jean Claude Van Damme chorar de inveja como uma noviça açoitada.

Já eu, durante a minha estadia, não demorei dois dias a sentir as mais agudas das dores nas pernas, passando grande parte do tempo restante a deslocar-me em ziguezague, como um leproso em fase terminal, gemendo a cada passada. Mas porra, se valeu a pena...

Toda a ilha me fez lembrar a Suíça. Não tanto a parte do yoddle e dos bancos mas mais no que concerne ao queijo. Eu sei que nos dias que correm se fala muito de buracos e tal mas, sejamos francos, aquilo está tudo esburacado. São tantos os túneis que povoam a Madeira que quase me fazem crer que esta tem caruncho. Depois, temos um problema. Há efectivamente um Centro de Saúde e uma Escola em cada terrinha, isso há. Mas com os túneis todos acabam por haver estabelecimentos com malta efectiva a trabalhar e a ganhar do belo, a cinco minutos uns dos outros. Portanto, não é preciso ser nenhum yoda em economia para perceber que isto mais tarde ou mais cedo ia dar chispalhada...

E depois há a descida dos cestos. Para quem não sabe é quando nos enfiamos em tobogãs de vime e somos empurrados ilha abaixo por corpulentos madeirenses que, a julgar pelo aspecto e pelas tatuagens nos antebraços, de bom grado nos espetariam de frente no primeiro penhasco se não soubessem que seriam judicialmente punidos por isso. Pode ser um tanto arcaico e até um pouco aparvalhado mas a verdade é que é também bastante divertido. Principalmente depois de passarmos pela experiência e continuarmos a ostentar os dentes da frente.

Há também o Museu da Baleia do Caniçal. Um verdadeiro santuário dividido em dois momentos. No primeiro é-nos dado a sentir um verdadeiro espectáculo de carnificina onde, e juntamente com o suave aroma de sangue e vísceras de baleia, podemos observar como durante décadas a malta da Madeira perseguiu e cortou às postas todos os cachalotes a que conseguiu deitar a unha. Já no segundo, mostram como entretanto se arrependeram e agora os estudam e lhes dão festinhas... Não deixa de ser um contraste um tanto ou quanto abrupto mas acho que resulta.

Além disso há ainda o artesanato de vime da Camacha, o vinho da Madeira, as piscinas naturais de água choca e com cheiro a mijo de Porto de Moniz (nas quais, e com plena consciência que com isso reduzi substancialmente a minha esperança de vida, mergulhei), a poncha, os maracujás, as espetadas...

Tudo coisas espectaculares.

Mas não tão espectaculares como a propaganda eleitoral para as votações que se avizinham.

Ao contrário do que eu pensava, não é só o PPD-PSD que pode promover os seus candidatos. Mas, tal como eu pensava, os outros partidos parecem gozar de substancialmente menos espaço para esse efeito. Há várias situações onde um gigante e titânico AJ, emplastrado num outdoor, aparece rodeado daquilo que parecem pequenos anõezinhos compostos pelos outros candidatos, impressos em cartazes de muito menores dimensões. Pode não ser muito justo mas o efeito é deveras engraçado.

De certa forma, esta diferença de escalas até acaba por castigar a falta de originalidade nos "gritos de guerra" daqueles que pretendem, afinal de contas, fazer um assalto ao poder: "Para salvar a Madeira" diz o aborrecido PS, "Acreditamos nos Madeirenses" diz a maçuda CDU, "ELE NÃO É A MADEIRA!" grita o sempre alarve Bloco de Esquerda enquanto exibe uma foto do olhar sinistro de AJ. Tudo tretas previsíveis e pouco estimulantes, diga-se. Ah e o maluco do Coelho que agora é do Partido Trabalhista também diz qualquer coisa... mas a verdade é que ninguém lhe presta muita atenção.

Seria de prever que numa altura como esta, com tanto fervilhar de emoções e de graves acontecimentos a virem a público, as coisas estivessem menos cinzentas. Mas, verdade seja dita, o único a apresentar uma abordagem objectiva e original foi, uma vez mais, o inevitável PPD-PSD.

Uma beleza apenas comparável à vista da marina do Funchal. Lindo, lindo, lindo.

O lema é : PRÁ FRENTE, SEMPRE! MADEIRA, SEMPRE!

Okay...

Como pano de fundo, há um inebriante gradient do azul para o amarelo e do amarelo para o azul. São as cores da Madeira, 'tá certo, até aí percebo... E o degradé dá-lhe aquele toque de modernidade que nenhum outro partido conseguiu atingir. E depois admirem-se que o homem não saia do poleiro! PRÁ FRENTE, indeed.

Ainda em relação ao slogan, não há maneira de o ler sem que na minha cabeça soe a voz de AJ a berrá-lo. E talvez para isso muito contribua a fotografia do próprio, estampada em cima do gradient, acentuando assim o efeito espectacular.


Sobre a figura de AJ, três aspectos:

- É notório que não tem qualquer pescoço. Do colarinho é espargida uma massa amarelo-rosada que, apesar de algo disforme, adquire um formato que se assemelha a uma cabeça... Assim como aquelas seringas dos bolos a expelir recheio.

- Todo e qualquer sujeito que procure tapar a careca com uns escassos e ralos fiapos de cabelo grisalho merece toda a minha admiração. Não é novidade para ninguém que, em pleno séc. XXI, este truque patético não causa qualquer ilusão (se é que alguma vez causou...) Por isso, quando um bravo se mantém irredutível na defesa desta técnica trompe l'oeil capilar e não se importa de assim aparecer em público, na TV e nos jornais, não me venham cá com AMI's nem com Médicos Sem Fronteiras mas coragem para mim é isto. Tudo o resto é panascaria.

- Urge ainda apontar que nesta foto de AJ não se vê o branco dos olhos. Todo o seu globo ocular aparece preenchido de um negro baço, como os olhos dos tubarões. E é por isso que, se eu fosse Madeirense, nenhum outro candidato me pareceria mais afável e digno de confiança.


Posto isto, não descansei até encontrar um boletim desta campanha com as propostas para o novo mandato. Boletim esse que, e com sacrifício pessoal, resgatei de uma pilha de caca de pombo. Tudo pela liberdade de informação, meus caros. Tudo pela liberdade de informação.

Aquilo que li e que estou prestes a partilhar foi alarmante e esclarecedor.

Antes eu tinha a impressão que AJ era uma espécie de tio bêbado que aparecia nas reuniões de família a gritar obscenidades às quais ninguém dava muita importância entre os olhares cruzados de desconforto. No final, alguém lhe passava uma nota de cinquenta euros para ir comprar mais vinho, ele ia à vida dele e as pessoas normais continuavam a conviver. Dantes eu pensava isto. Depois de ler o boletim, acho que tenho a certeza.

Mas antes de me ir embora e regressar às férias, gostava de aqui vos deixar um cheirinho... Assim só p'ra não dizerem que guardo tudo para mim. Ora então cá vai...


MANIFESTO DO PSD AO POVO DE FUNCHAL (Ui um manifesto... Isto promete. "Morra o Cont'nente morra, Pim!" Capaz de ser mais ou menos isto que nos espera)

AOS MADEIRENSES E PORTOSSANTENSES:

O Povo Madeirense vai eleger o Governo que terá de aguentar o período mais duro desde que a Democracia e a Autonomia Política nasceram com a Constituição de 1976. (Boa, estão a falar de Constituição... Dados os acontecimentos recentes e o avacalhar da mesma, tem de ser bom!)

Os Madeirenses e os Portossantenses vão eleger o Governo Regional que terá de Os conduzir e defender o melhor possível, face à situação gravíssima que os socialistas criaram (O BANDIDO DO SÓCRAS!), que provocou Portugal ficar sob mando estrangeiro (O MALDITO INVASOR!) e, se quiser comer (Quem? Portugal?), ter de aplicar a política que nos foi imposta pela vergonhosa tutela internacional a que chegámos (Como se atreve o FMI a impor políticas?? Não temos cá quem o faça tão bem? Alguém da Madeira, por exemplo...)

Um Governo Regional que terá de demonstrar capacidade para conduzir o arquipélago nas dificílimas situações que, por caírem sobre Portugal, infelizmente caiem também sobre os Madeirenses e os Portossantenses, embora tal não seja justo em relação a um povo que sempre discordou do que se passava, que foi sempre oposição ao próprio sistema político, que sempre alertou Lisboa para os erros desta (Infelizmente o sotaque Madeirense é cerrado e Lisboa não percebeu... De qualquer maneira, o tal "povo", chamemos assim ao governo de AJ, acabou por perder alguma legitimidade no assunto "poupança" quando apresentou um buraco do tamanho da defesa do Sporting).

Portanto, o que agora está em jogo para os Madeirenses e os Portossanteneses (Ok, é preciso estar sempre a repetir o mesmo???), é escolher um Presidente de um Governo Regional que, com o novo Executivo que formar, dê garantias de hábil e inteligentemente enfrentar a situação complicadíssima em que os socialistas nos mergulharam. (MAS QUEM, MEU DEUS?! Se ao menos houvesse um indivíduo grosseiro que só sabe falar a berrar e usar técnicas de inimigo público e de mania da perseguição a la regimes ditatoriais da primeira metade do século XX... MAS ONDE ENCONTRAR TAL PERSONALIDADE?!)

(...)

Depois seguem-se parágrafos intermináveis, praticamente todos eles a dizerem o mesmo, estilo aquelas gravações em loop do filme 1984, a fomentar o ódio pelos socialistas e a glorificar a obra feita pelo actual Governo Regional. Glorificação essa que chega ao ponto de dizer que:

Seria uma covardia, Alberto João Jardim recuar ou desistir no presente quadro. Sabe ao que se arrisca, dadas as dificuldades que vamos ter pela frente, risco de saúde inclusive, quando era mais fácil abandonar ante o que aí vem, levando consigo os sucessos e transformações que conseguiu. (Portanto, estamos na iminência de coroar aqui um mártir. A avaliar por estas palavras pouco falta para AJ vestir um colete de bombas e atirar-se heroicamente para a entrada do buraco orçamental, esperando que a consequente queda de rochas o tape para sempre. Pode ser fantasioso mas não condenem um homem por sonhar acordado...).

Segue-se mais conversa em como os socialistas ficaram a dever dinheiro à Madeira e/ou inclusivamente a roubaram e depois aquele que considero o parágrafo-rei deste maravilhoso boletim. Desde já aviso que é sublime. Ora então cá vai:

Depois de trinta e três anos, a Oposição está desesperada. Não captou pessoas com um mínimo de qualidade, alinhou contra o próprio Povo Madeirense, opôs-se sempre a tudo quanto era progresso, praticou um permanente bota-abaixo, não tem alternativas, só fascina os desordeiros, bêbados, drogados e vadios que infelizmente existem em diversas localidades.

...

Portanto...

Está aqui identificada a Oposição na Madeira.

Isto para que não restem dúvidas.

...

Não sei quanto a vocês mas eu leio isto e parece que ouço Chopin ao longe... De tão lírico e filosófico que é. E ao mesmo tempo também associo aos primórdios da minha infância, não sei se me faço entender. "Quem não gosta de mim é parvo", é comum ouvirmos no Jardim Escola. "Quem não gosta de nós é bêbado ou drogado!", parece que se ouve muito na Madeira. Mainada!

Bom, mais argumentação incendiária até ao fim e, a fechar a peça, 90% do boletim consiste de uma lista das chamadas INAUGURAÇÕES REALIZADAS NO CONCELHO DO FUNCHAL. Um verdadeiro "festival da tesoura".

Aqui encontramos um compêndio infindável com obras tão relevantes como a Creche de Santa Maria Maior, o Lar de Abrigo de Nossa Senhora de Fátima ou a Unidade de Hemodiálise do Hospital do Funchal e outras com consideravelmente menos relevo e até algum nível de suspeita como o Ginásio Big Body Gym, a Padaria Mariazinha II, o Crédito Predial Português (que não existe vai p'ra mais de dez anos) e a Discoteca Vespas. Se calhar não era suposto eu ler isto tudo até ao fim mas, que raio, tinha tempo e li.

E pronto, não vos chateio mais. Se calhar têm a sopa ao lume e de certeza muito mais que fazer.

Cheguei ontem da Madeira e ainda vou ter mais uma semana de férias por isso é possível que o meu período de descanso ainda me dê mais material para fazer pouco...

Eu perco-me para aqui a falar do AJ e de tudo e mais alguma coisa mas a verdade é que não sou nada melhor do que ele. Quando era miúdo roubei uns autocolantes das Tartarugas Ninja a um colega de escola e culpei um outro que usava óculos e tinha asma. Ele levou nos cornos e eu fiquei a ver, com um sorriso na cara. Portanto, em matéria de sem vergonhice não é qualquer um que me dá lições...

Mas entretanto, se viverem no Arquipélago, votem em consciência.
Se, por outro lado, viverem no Continente, rezem para que os outros o façam e a seguir tentem manter o emprego porque são os subsídios de Natal de todos que vão ajudar a pagar o tal buraco. No fundo, acaba por ser menos uma Wii ou um Castelo dos Gormiti que o mimado do vosso puto recebe. E ainda bem porque sem essa importante lição de vida quem sabe se não acabaria por tornar-se num adulto egocêntrico, em alguém com a mania das grandezas ou até, quem sabe...

... no Presidente de um Governo Regional.

Thursday, September 8, 2011

Ok, temos aqui um problema

Acredito que as balanças foram criadas com o objectivo de ajudar as pessoas a controlarem o seu peso e assim manterem uma melhor qualidade de vida.

Há quem acredite em Deus ou em vida extraterrestre. Eu acredito nisto. E acho que não há missão mais nobre para um aparelho.

É por estas e por outras que se me perguntarem se as balanças têm razão de existir e se não seria melhor ideia juntá-las todas a arder em sítios próprios como uma pira, num descampado ou no relvado do Estádio do Sporting, a minha resposta é "Não, senhor! Deixem-nas estar." e não se fala mais no assunto. Mas atenção: devem existir sobretudo para ajudar OS OUTROS, ok? Outra malta que não eu. Porque quando toca a mim a conversa já é diferente...

Nunca nenhuma balança me deu boas notícias. Nunca me colocou um sorriso na face, nunca me perguntou pela família ou deixou uma palavra amiga. Quando sou eu a pisar uma balança aquilo que vejo no mostrador é um misto de intensa agonia para que saia imediatamente (se um monte de plástico e parafusos tivesse a capacidade de berrar, berrava e bem) e a gentileza subtil de um coveiro embriagado a dar-me a terrível má nova de que estou gordo como um urso pardo com bócio. Sempre. Assim, e embora as respeite, também é por estas e por outras que evito relacionar-me com este tipo de maquinetas...

No outro dia, acompanhei uma amiga que não se estava a sentir bem a uma farmácia. Com o pretexto de que uma das razões do seu mal estar se devia ao seu estado de magreza extrema obriguei-a a subir para uma, lá está, balança, e a encarar assim a terrível verdade. No entanto, o papel impresso pelo "oráculo medidor de banha" veio provar que eu estava errado e que efectivamente a minha amiga estava em boa forma. A minha ideia de "magreza extrema" tinha sido portanto deturpada pela comparação com a minha pessoa sendo que é perfeitamente possível uma jovem adulta ter metade do meu tamanho e ser exactamente por isso que está com o peso ideal. Enfim...

O que consegui com a brincadeira foi ter de saltar logo a seguir para cima da plataforma. Achei que fazia sentido. Mas, como é evidente, arrependi-me nem um milésimo de segundo depois...

Primeiro a altura... 1,77 m

Até aqui tudo bem.
Nunca fui muito alto mas também não sou nenhum caga tacos. É uma altura que me permite chegar a um tupperware na última prateleira do armário da cozinha e ao mesmo tempo me impede de fazer figuras tristes no Portugal dos Pequenitos em Coimbra. Portanto, ao nível da altura, 5 estrelas.

Depois o peso... 96 kg

...

Ok, temos aqui um problema.

Não me interpretem mal, poderia até ser uma boa marca... caso eu pertencesse a uma qualquer ganadaria. Mas sendo eu humano e não tendo perspectivas de ser toureado num futuro próximo parece-me que tenho de fazer alguma coisa para impedir que qualquer dia os CTT me atribuam o meu próprio código postal.

Fui-me inscrever num ginásio. Pela 8340ª vez, mas ainda assim fui. A última aventura que tivera no mundo do desporto não fora propriamente brilhante e não me deixara as melhores recordações, como decerto se lembrarão devido a este testemunho. Em traços muito gerais: fui praticar natação livre para umas piscinas duma associação que trata malta com uma doença degenerativa nas costas. Na sua maior parte, idosos. E um dia tive conhecimento que estava um aviso no placard a dizer que já não era a primeira vez que eram encontradas fezes na água. Enfim, ainda não consigo escrever isto sem sofrer uma violenta contracção na traqueia mas não quis deixar de contextualizar.

Até porque agora a realidade é diferente. Num ginásio e a fazer cardio fitness, raios m'a partam se também encontro lá fezes!!!

Eu nem quero falar muito nisso que o Todo Poderoso ainda acha piada e aproveita para fazer das suas. É conhecido o seu bizarro entusiasmo por me lixar a vida e depois divertir-se às minhas custas, como se a minha existência fosse o seu reality show de palhaçada preferido. Tantas eras da História em que podia ter vivido e tive de aparecer logo quando o Velhote está no pico da senilidade...

Anyway...

Hoje foi o meu primeiro dia de exercício físico.
Sim, escrevo estas linhas depois de ter estado uma hora e meia a perceber o porquê do Cláudio Ramos recorrer à lipoaspiração sempre que quer eliminar a celulite do rabo. Mas eu com isto não pretendo descredibilizar a lipoaspiração, note-se. Conseguem-se os melhores resultados e não é preciso sofrer como uma noviça ao primeiro aborto. O problema é que eu sei que a mesma mão que assinaria o cheque deste tipo de cirurgias estaria também mais tarde a escolher vestidos na Bershka. E se as cores da Bershka me ficam mal...

Mas anyway outra vez...

Hoje foi o dia da avaliação.
Portanto, aquele em que conheço o meu plano de treinos para os próximos meses e compreendo que vou pagar com o sangue as pazadas de sushi e de vinhaça que emborquei desde nem eu sei quando. Ao ver o instrutor a preencher a tabela senti-me um Renato Seabra a ouvir a sentença. Se soube bem fazer o que fiz, não há dúvida que soube. Mas agora vou-me f***r à grande!

O instrutor era aquilo a que se chama na gíria de "um puto porreiro". Estivemos a falar sobre artes marciais talvez até mais tempo do que seria necessário mas eu intencionalmente decidi prolongar a conversa para roubar minutos ao massacre físico que estava prestar a abraçar. Reparei que ele insistia em tratar-me por você, e isso estava a incomodar-me bastante. Não tanto pela palavra em si, até porque era normal dado que tínhamos acabado de nos conhecer, mas pela forma como a dizia. Como se eu fosse muito muito mais velho... Ora se eu tenho 28 e ele não devia ter mais de 25, parece-me que 3 anos de diferença não justificavam aqueles salamaleques todos. E não era só o "você", eram os cuidados todos que ele tinha com o meu historial clínico e em especial com a condição cardíaca. Como se eu andasse a gritar "enfarte do miocárdio" por todos os poros...

Enfim, chateou-me.

Inaugurei logo o novo "plano de terror" com quinze minutinhos de bicicleta.
Até me virem dizer que aquela era onde costumavam andar as mulheres e os obesos.

Começava bem...

No entanto, como tecnicamente até me insiro na segunda categoria, deixei-me estar e acabei o exercício.

O resto do treino foi uma divertida sucessão de dor, arrependimento e mágoa. Se fosse uma cantiga era sem dúvida "O Fado da Lontra" mas como não era acabou por ser apenas uma breve amostra de algo que vai fazer parte da minha vida pelo menos durante os próximos meses. Não me queixo, ainda bem que posso dar-me ao luxo de pagar por exercício em condições. Mas também não posso evitar de pensar em todo o dinheiro que se investe, por exemplo, a incentivar os estúpidos casais de pandas a querer mocar e no tão pouco que se aplica em tornar o real enchimento do bandulho num método de emagrecimento. São prioridades...

À saída do ginásio, e como não podia deixar de ser, aqui o campeão tinha de deixar o seu extraordinário carimbo de super-palermice em forma de pièce de résistance. Não bastava sair do recinto branco e encharcado como uma foca do Ártico atordoada... havia mesmo de deixar uma impressão memorável.

Uma vez mais, o jovem instrutor abordou-me para perguntar como tinha corrido o treino... se me estava a sentir bem... se me aguentava...

Você, você, você...

A sua saúde, a sua saúde, a sua saúde...

O coração, o coração, o coração...

...

Até que eu...

Decidi dizer a coisa mais incrivelmente IDIOTA...

Que alguma vez alguém poderia ter dito em qualquer situação...

Em qualquer país do mundo...

Em qualquer momento da História Universal...

...

Perante todo este cenário de formalidades, virei-me para o puto e disse...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

...

TRATA-ME POR TU, QUE EU TAMBÉM SOU NOVO...

...

...

...

...

MAS NO QUE É QUE RAIO ESTAVA EU A PENSAR?!!



PORRA!!! FIZERAM-ME UMA LOBOTOMIA E NINGUÉM ME DISSE?!



"TRATA-ME POR TU, QUE EU TAMBÉM SOU NOVO?!!!" WHAT DA FUCK?!!!



ISTO É O TIPO DE COISAS QUE SE ESPERA OUVIR DE UM TIPO COM SUSPENSÓRIOS E UM DAQUELES BONÉS COM UMA HÉLICE...



CA GRANDESSÍSSIMA ESTUPIDEZ!!!



"QUE EU TAMBÉM SOU NOVO..." OH MEU DEUS! QUE ATRASADO MENTAL!



Este tipo de merdas faz-me lembrar outra das minhas festas de anos em casa quando a mãe de uma amiga minha, a tal que era convidada todos os anos, trouxe o filho mais novo, que não tinha sido convidado, só porque não lhe apetecia ficar a tomar conta dele.

Então, mal os meus pais abriram a porta e a minha amiga entrou para brincar connosco, a mulher empurrou o miúdo na mesma direcção e empunhando um saco manhoso de miniaturas de aviões de guerra coloridos, afirmou:

- O menino também vem porque também traz prenda!

Nessa altura apeteceu-me introduzir-lhe pelo recto os horrendos aviões, um por um!
Não só à gaja que dizia isto mas também ao desgraçado do puto que tinha a cabeça esférica e vermelha, semelhante a um queijo Limiano, prestes a explodir de vergonha.

MESMO ESSE EPISÓDIO NÃO SE EQUIPARA EM TERMOS DE IMBECILIDADE À MINHA BRILHANTE SAÍDA.

...

Enfim, estou cansado.
Não tanto do exercício mas fundamentalmente disto. Ainda assim há mais soluções para aqueles que têm excesso de peso do que para os que falam sem pensar. Isso é que era um desporto a sério e que só por si faria maravilhas no meu futuro.

* suspiro *

Tuesday, August 2, 2011

EHPÁ DANCEM!!!

Ora bem, então parece que o Saguim habita um novo galho.
Sim, é verdade. As macacadas mudaram-se definitivamente para outro sítio há duas semanas.

Já não há vizinho cornudo. Já não há discussões entre marginais na paragem do autocarro. Já não há ordinário riscador de carros...

E até hoje também não havia gás.

Há bocado ligaram-me a dizer que já há, mas eu sou como São Tomé: ver para crer. A grande generalidade do público deve estar agora a pensar que, como não havia gás, estive este tempo todo sem tomar banho. Falo daquela generalidade do público que tem o odor apurado e que lida comigo diariamente. Porém, não há suposição mais falsa. O banho tem sido "à chinês" com a ajuda de uma panela de água quente e de dois alguidares. Felizmente, isto é o mais próximo que já estive do Terceiro Mundo. Bom, houve também aquela vez que passei a dois metros de um autocarro dos Super Dragões mas isso é outra conversa...

Parecendo que não, isto de não ter água quente para tomar banho faz alguma diferença. Há sempre quem diga que agora é Verão e que não custa nada tomar um duche de água fria mas como essas pessoas são imbecis, a sua opinião não pode ser levada a sério. Eu posso não conhecer muita coisa mas conheço o meu corpo o suficiente para saber que a cada duche gelado há funções fisiológicas que perco para sempre. Eu sei disso porque, em total desespero, tentei fazê-lo há uns dias. E agora sou incapaz de conter o fluxo de ranho sempre que estou perto de um rádio a pilhas. Enfim...

A casa nova é inovadora a vários níveis relativamente à de Benfica (e nem sequer estou a falar da ausência dos cornos do vizinho do lado marcados na parede da sala). A vizinhança é pacata e bem disposta. Quando dou os bons dias e boas tardes a alguém, a resposta que obtenho não é nenhum grunhido cavernoso e/ou uma valente bufa na minha direcção. Respondem na mesma moeda e volta e meia até sorriem... SORRIEM! Eu sei que é difícil explicar a minha alegria mas por favor tentem. Quanto ao barulho, anteontem um amigo deslocou-se lá a casa para fazer uns buracos com o black&decker e às 21h ainda estava a malhar no estuque como um moicano. Ninguém reclamou, ninguém insultou, ninguém disse absolutamente nada. O que me leva a concluir que desta vez o cigano devo ser mesmo eu.

Também não há nenhum restaurante de sushi ao virar da esquina, o que só por si deve permitir que consiga pagar o empréstimo ao banco até ao fim. São coisas como estas que quase me fazem esquecer os 9 meses que penei à espera que o processo das obras acabasse para finalmente recuperar todos os meus pertences e roupas. Esta última parte foi mesmo um problema. Nunca pensei estar tanto tempo à espera e portanto pus de parte uma ínfima parte do amontoado de trapos incoerente a que chamo de "a minha roupa". A dada altura, tentei todas as combinações possíveis, e algumas bem ridículas devo acrescentar, o que proporcionou olhares de pena dos meus colegas de trabalho e sorrisos nervosos da minha parte. Mas tudo isso está para trás das costas.

Até a gata está mais calma e dócil. Claro que para isso também muito contribui o milagroso efeito dos antidepressivos mas de qualquer maneira gosto de acreditar que ela aprova o novo poiso. Por falar em antidepressivos, parece que as ordens do veterinário são para começar a parar por esta altura. Eu estou renitente, até porque aprecio dormir entre as 5h até às 8h, mas também não posso estar a drogar um animal só para garantir o meu conforto. Ou posso...?

As coisas estão lentamente a ir ao lugar. E parece tudo tão bem que o santo começa a desconfiar. Qualquer dia abro a porta da casa e está um corcunda a arrastar um cadáver para a casa ao lado, ou assim. Sinto que alguma coisa de terrível está para acontecer, que estou apenas iludido sem querer ver o buraco fétido e lamacento onde me fui enterrar, mas vou ter de esperar mais alguns dias para ter a certeza. As coisas também não podem ser sempre à minha vontade. Aprendi isso em criança, numa das minhas festas de anos em casa...

(música e efeitos visuais indicativos de flashback)

Naquela altura, a minha lista de convidados contava com 19 rapazes e uma só rapariga (normalmente era a mais feia da turma porque era insuspeita, não podia correr o risco de convidar uma gira porque depois toda a gente ia achar que eu gostava dela. Todos nos protegíamos criteriosamente nesse aspecto). Houve um ano em que em vez de uma convidei duas, o que era só por si um grande acontecimento, e decidi que iria organizar um concurso de dança em minha casa. Um concurso de dança com 18 rapazes e 2 raparigas. Adivinhava-se espectáculo.

Vai daí, preparei uma cassete com uma cuidada compilação de música de dança. Recorri ao que tinha em casa. Queen, portanto. Uma banda que animava as discotecas pelo mundo fora...

Ok, recapitulemos: um rácio absolutamente desequilibrado de miúdos e miúdas com o fenomenal elo de ligação de um tipo de música que, tipo, não dá para dançar.

E eu sempre a achar que a ideia era genial.

No dia da festa de aniversário, eliminei logo o primeiro problema ao seleccionar dois rapazes da minha preferência. Os outros todos podiam enfiar os croquetes e os rissóis de camarão no cu porque eu tinha um concurso de dança para promover. O júri era eu, claro. Só. Isso nem se questionava.

Enfiei-me no quarto com os dois casais, vermelhos como tomates e envergonhados como noviças no Cinema Olympia, e coloquei a cassete dos Queen a tocar. Eles, parados a olhar uns para os outros, tentaram dizer-me que tinham dificuldade em dançar ao som daquele tipo de música. Eu mandei-os improvisar e fui sentar-me junto á parede com um bloco e uma caneta nas mãos (suponho que para dar notas) e com um sorriso entusiasmado na cara.

Eles não dançavam.

Formando dois pares, com os "bailarinos" de frente um para o outro, flectiam nervosamente os joelhos e mexiam as mãos de forma descoordenada. Só para deixar satisfeito o aniversariamente que começava a ficar irritado com tamanha falta de jeito.

As queixas eram muitas... Que não estavam a sentir o ritmo. Que não lhes apetecia. Que não era o momento certo. E os minutos sucediam-se fazendo abater-se sobre o quarto um denso manto de desconforto e ira.

A dada altura, passei-me da marmita. Aquilo era demais.

Perante a passividade dos meus convidados berrei com todas as forças que as minha jovens artérias me proporcionavam:

- EHPÁ DANCEM!!!

...

...

...

(piscar de olhos)

...

...

(as lágrimas a escorrer silenciosamente pelas caras dos meus amigos)

...

...

(gemidos surdos)

...

...

(mais flectir nervoso de joelhos e movimento descoordenado de mãos, agora com maior intensidade).

...

- Bom, isto não está a resultar. Vamos mas é voltar para junto dos outros. - acabei por concluir eu, perante a debandada mais rápida de seres humanos que alguma vez testemunhei.


(música e efeitos visuais indicativos de fim de flashback)


Nessa mesma noite o meu pai explicou-me que o que fizera fora extremamente desumano.

Extremamente.

Fosse o meu pai Staline ou Mussolini acredito que o teria enchido de orgulho. Mas como não era, nem nunca foi, a reacção foi de grande preocupação e, porque não dizê-lo, de algum medo.

De facto, ele tinha toda a razão. Em que é que eu estaria a pensar... "EHPÁ DANCEM!!!"??? E o teatro todo antes... Mais valia ter acrescentado "PALHAÇOS" também. Já que estava com a mão na massa. "EHPÁ DANCEM, PALHAÇOS!!!" Ao menos teria sido coerente do princípio ao fim.

Bom, esse foi um momento de viragem, a partir daí jurei não me impor demasiado a ninguém.
E sei que a vida não me dá obrigatoriamente aquilo que acho que devo ter.

Por isso, parece que agora corre tudo muito bem com a casa e tal.

Mas se as coisas derem para o torto, de nada me valerá voltar a berrar "EHPÁ DANCEM!!!"

Ou valerá...?

Tuesday, June 28, 2011

Tudo o que você queria saber sobre camionetas... e tem vergonha de perguntar

Quem é que aqui odeia autocarros?

Quero ver mãos no ar...

Ena tantas!

São cá dos meus!

Odeio autocarros sim senhor e não tenho vergonha nenhuma de gritá-lo aos sete ventos. Aliás, já o fiz aqui mesmo neste canto internético obscuro há uns quantos anos atrás, num post bem velhinho. Na altura, apelidei-os singelamente de "carripanas de Satanás" e quem tem de andar neles todos os dias não pode deixar de dar-me razão.

Se por outro lado aparecer alguém activista das vis transportadoras de gado humano a mandar-me enfiar as opiniões onde o sol não brilha, a existência de tais criaturas faz com que possa dizer que na minha vida já vi de tudo, a par do clássico porco a andar de bicicleta.

Bom, mas não quero alongar-me demasiado sobre o assunto. Aquilo que me traz aqui hoje é algo ligeiramente diferente...

Dado este meu ódio de estimação não é senão irónico quando me vejo, por razões profissionais, a ir e vir a Beja todas as semanas de camioneta. Não que tenha sido a minha primeira escolha, a camioneta. É que fazer a viagem de carro obrigar-me-ia a passar boa parte do mês sem ter mais do que aquelas folhas velhas de alface que ficam caídas no chão dos supermercados para comer, por não sobrar qualquer dinheiro depois da gasolina e das portagens... E parece que também houve alguém genial que achou que haver comboios para Beja era coisa de finórios e que o melhor era acabar com essas mordomias do catano.

Restou-me a porra da camioneta.

Que, diga-se de passagem, é perigosamente semelhante com "aquele que não dizemos o nome".

Três horas e meia para lá, três horas e meia para cá, sete horas no final do dia... Nem interessa o que vou lá fazer, tanto sacrifício devia valer-me já a canonização e a definição de mártir. Aqui entre nós, não sei bem que benefício me trariam estes títulos ou se me ajudariam a arranjar emprego, mas com certeza não hão-de prejudicar o meu curriculum vitae. Conto é com vocês para tratarem das papeladas com o Vaticano que eu sinto muito cansaço.

Ora bem, o que tenho eu a concluir depois de quase dois meses nestas andanças?

1.
Eu não sou homem suficiente para andar de camioneta. Isto, tal qual. Nos dias de viagem, chego à rodoviária por volta das 6h30. Só para verem a estaleca deste menino. Estaleca que nada tem a ver com virilidade, diga-se. Depois de comprar o bilhete dirijo-me para o café onde bebo a primeira bica do dia. Recentemente, numa destas minhas incursões matinais à cafeína testemunhei a acção de um homem negro que, abrindo a goela como uma avestruz, espetou um copanázio de brandy no bucho mais depressa do que me levou a dizer "CUIDADO, VAI EXPLODIR!!!" Com um cartão de visita destes, tomei logo respeito às camionetas e às pessoas que as frequentam. Sei que sou apenas um estagiário nisto do "camionetismo" (está inventada a palavra) porque se me atrevesse a fazer escorregar uma pomada daquelas pela traqueia adentro assim de manhãzinha faria o caminho de volta borrando-me e largando golfadas de vómito a cada passo até à porta do veículo. Um percurso assim não seria nada honroso e condenar-me-ia a ser gozado em cada viagem.

2.
A malta olha de lado para os betinhos que gostam de sentar-se nos lugares que estão no bilhete. Fosse aquilo uma escola C+S e não uma camioneta, muito calduço havia de assentar no pescoçame de quem andasse com o papelinho na mão à procura do estofo correcto. Eu sei porque fazia isso no início até uma velha me mostrar os caninos da dentadura, rosnando em ameaça. Eu disse-lhe que era só enquanto as outras pessoas não se sentavam, por uma questão de respeito pelo próximo e para não estar a ocupar a cadeira de alguém. Mas ela começou a resmungar, dizendo que era estúpido eu querer aproximar-me a menos de meio metro de uma pessoa sendo que a camioneta ia vazia. E tinha a sua razão, o raio da velha. De facto, só um tarado gerondófilo faria tal coisa... Ou então um palerma como eu. Contive-me uns segundos mais ao seu lado, suando abundantemente da testa, à espera do momento certo para sair daquele que era afinal de contas o lugar que me estava destinado pelo bilhete e ir para um dos outros lugares vazios. Até que, ligeiro como um esquilo, ou então tão ligeiro quanto o meu corpo me permite ser, saltei do lugar e fugi sem olhar para trás, procurando ignorar um resmungar ainda mais intenso da velha morcega. Serviu-me de emenda e nunca mais me sentei no meu lugar. A isto chama-se aprender.

3.
Há malta que não sabe lidar com o enjoo. Pura e simplesmente, não sabe. Quando eu estou enjoado enterro dois dedos na garganta e trato do assunto à boa e velha maneira pirata. Não é nenhum drama nem ninguém morre por causa disso. No outro dia, a meio caminho para Beja, a camioneta parou e o condutor dirigiu-se até meio do veículo para auxiliar um passageiro em dificuldades. Era uma pensionista que estava prestes a vomitar, enjoada como uma vaca no matadouro e que, como não podia deixar de ser, aproveitava para desempenhar um longo papel dramático numa peça de sua autoria. Estivesse lá o La Féria e começava tudo a cantar e a dançar, erguendo a velha em braços de onde saltavam triunfantes a Anabela e o Carlos Quintas. Anyway... a mulher mostrava o seu mais profundo mal-estar através do balido monocórdico e inquietante:

Ai...

Ai...

Ai...

- Quer água, minha senhora? (perguntava o estúpido do motorista que devia estar a fazer a porra do seu trabalho e a levar-me para Beja de modo a poder fazer o meu)

Ai...

Ai...

Ai...

- Ela disse que ia para um funeral e que mal tinha dormido... Está mal disposta. (comentava uma velha que não conhecia a outra mas que fazia questão de relatar para todos os passageiros as conversas que tinham partilhado desde o início da viagem, por irem lado-a-lado)

Ai...

Ai...

Ai...

- Olhe eu acho bem que já não vá a funeral nenhum porque senão ainda fica lá também! (dizia a velha número dois enquanto agarrava num saco de plástico que já continha no interior o vomitado da velha número 1, e quiçá também a sua dentadura. Aqui, tive de me rir).

Ai...

Ai...

Ai...

Ai...

Tive vontade de me levantar do lugar e tirar a mulher do sofrimento apertando-lhe o gargomil. "AI AI AI O QUÊ?! PORRA! VOMITA COMO UM CÃO E MIJA COMO UM HOMEM A SEGUIR QUE EU TENHO DE IR TRABALHAR!!!" (não sei bem porque lhe gritaria tal coisa mas foi o que me ocorreu). Enfim, a velha lá se sentiu melhor e pudemos seguir viagem. Sem ser preciso aviar-lhe uma ou duas chapadas, o que acabou por ser mais simpático. Mas não ganhei para o susto.

4.
Existem camionetas melhores do que outras. De manhã costumo sempre comprar o bilhete de ida e de volta, mas como hoje por exemplo me despachei mais cedo, antecipei um pouco o regresso trocando a passagem na bilheteira. E a verdade é que acertei em cheio! A camioneta das 17h não só tem rede wireless para os passageiros como tem uma TV e até uma hospedeira.... Tipo as dos aviões. Calculo que aquelas que vão trabalhar para a Rede Expressos sejam as que chumbaram nos exames da TAP. A malta que anda de camioneta é que tem de levar com o refugo. No entanto, é engraçado ver a forma como ela fazia o seu trabalho fantasiando que estava numa aeronave. A maneira como fazia os anúncios por microfone aos passageiros, a forma como nos oferecia sandes prontas a comer, a doçura com que me pediu que baixasse o som dos meus phones... Confesso que esta não percebi. A música que estava a ouvir estava demasiado alta. Como se eu fosse um daqueles mitras com o rádio ao ombro a ouvir kizomba. Eu estava muito sossegadinho com o meu mp3 no bolso a ouvir a minha música, sem chatear ninguém e tive de baixar o som porque segundo a tipa "estava demasiado alto". Das duas uma, ou foi só p'ra me chatear (hipótese muito viável) ou então faz parte de um novo serviço de "saúde e cuidado". As hospedeiras das camionetas têm não só de se certificar que temos tudo o que precisamos para uma viagem confortável como também não avacalhamos os tímpanos com o ruído. 'Tá giro! Giro giro também era ver esta alminha ao lado do condutor da camioneta. Uma na base da carreira de hospedeira, outro no topo da carreira de motorista de camionetas. Cada um tem o que merece...


E assim tem sido a minha vida, além de tudo o resto.
Ansiando que estas conclusões me ajudem a sobreviver àquilo que ainda aí vem.

E que um dia, quem sabe, consiga o financiamento para acabar de vez com tudo aquilo que se assemelhe a um pérfido e fedorento autocarro. Eu mando mails mas não me respondem.

Sovinas...

Thursday, June 16, 2011

5 perguntinhas muito breves

Eu sei que tenho aparecido pouco neste nosso convívio... Por favor não batam mais no ceguinho, ok?

Sei também que poucas coisas vos fizeram mais felizes nas últimas semanas do que não receber os meus sempre aborrecidos mails a sugerir para aqui virem ler disparate... Enfim, lamento retirar os sorrisos relaxados das vossas faces e chamar novamente à vossa atenção para coisas que são estúpidas e não têm interesse nenhum.

Tenho andado ausente porquê?!

Precisamente pelas perguntas que marinam na minha cabeça e para as quais não encontro resposta. Isso é daquelas coisas que me tiram o sono, me roubam o cabelo (quem está perto de mim sabe do que falo... há pastagens na Etiópia mais férteis do que o meu couro cabeludo neste momento) e fazem tremelicar o olho esquerdo sempre que muda a hora. Ando cansado e com relativo stress.

E por isso, por estar tão perto da insanidade, considero mais interessante passar o dia com dois copos de iogurte enfiados nas orelhas do que vir para aqui desabafar com um ecrã de computador.

Mas dizia eu que nos últimos tempos estava a ser assombrado por perguntas, não era?
Bom, então aqui vão elas:

5 PERGUNTINHAS MUITO BREVES QUE ME ESTÃO A ROUBAR O JUÍZO

1.
Porque é que, quando eu era miúdo, não podia ver os filmes do Robocop?

Porquê?!
É que eu via os outros todos... Mais e menos violentos. Via os Seagals, os Norris, os Van Dammes, os Stallones e os Schwarzennegers da vida... Porque não o raio do Robocop?! Ainda hoje não percebo qual era o critério do meu pai (por favor explica-me!) mas o que é certo é que só recentemente vi o raio do filme e continuo sem perceber. Ok, tem violência gratuita (sem contarmos com o dinheiro gasto no DVD, claro). Ok, tem partes ordinárias. Ok, tem alguma estupidez. Mas esses três ingredientes, sejamos sinceros, FORAM só por si os anos 90... Quem é que se lembra do "Big Show Sic"? Tinha tudo isto e muito mais! O facto de me ter sido negado o visionamento dos filmes do "Robocop" tem-me tirado o sono por duas razões: porque o conteúdo dos mesmos não era em nada inferior a qualquer dos seriados da autoria do Ediberto Lima e porque é cada vez mais evidente que não me resta grande sanidade nesta bola de bilhar parcamente peluda a que chamo de cabeça.

2.
Porque é que, quando eu era miúdo, não me deixavam comer Suissinhos?

Outra...
Eu sei que como adulto deviam haver mais coisas com que me entreter. Mas só muito recentemente é que comi o meu primeiro Suissinho e isso temos de convir que é deprimente. Deprimente, sobretudo, também por duas razões: porque não há grande razão para mo terem negado no passado e porque é preciso lata e zero de amor próprio para um indivíduo da minha idade e tamanho sair do Pingo Doce com um Suissinho na mão. Vamos lá ver uma coisa: quando eu era pequeno, o conceito de alimento para mim era abrangente. Muito abrangente. Comia TUDO e DE TUDO... tendo especial cuidado para não ingerir coisas saudáveis ou que de uma certa forma me fizessem bem ao organismo. Nisso sempre fui criterioso, não vou mentir. Na altura, talvez achassem que o Suissinho era demasiado nutritivo e que, tendo eu aos 6 anos a compleição de um búfalo adulto, não precisava de mais energia e/ou gordura. Ok, respeito isso... Embora não tenha a certeza que fosse essa a verdadeira razão. Não foi fácil chegar aos 28 anos sem saber ao que sabia aquilo. Agora já sei mas continua a assombrar-me. Malditos queijos!

3.
Porque é que eu comprei uma casa há 8 meses e ainda não estou lá a morar?

Bom, esta é a questão fulcral e aquela que me está a fazer enlouquecer a passos largos. Não é do meu feitio apontar dedos e responsabilizar gente. Mas a culpa é da minha mulher! Ok, talvez não seja só dela... Acho que é um pouco de toda a gente, de todos os seres vivos do mundo que de alguma forma se perfilaram com uma estúpida conjuntura de astros e forças gravitacionais (não sei do que estou a falar mas mais vale aproveitar o embalo e terminar este raciocínio idiota) para que simplesmente não fosse possível usufruir do imóvel que vou andar a pagar até transportar uma algália quando quiser ir ao cinema. Foi o empréstimo, foi a compra, foram as obras, foram os materiais, foi tudo e mais um par de botas. E agora parece que está quase mas claro que eu já não acredito nisso... Daqui a 15 anos se for vivo, pode ser que possa começar a colocar lá os meus tarecos.

4.
Porque é que a minha gata anda feita um docinho conventual?

Esta é fácil: porque está a tomar anti-depressivos.
E confesso que nunca fui tão feliz. A paz impera.
Parece que a bicha começou a bater mal por ter saído da casa de Benfica, onde o vizinho cornudo gostava de enfiar valentes marradas na parede sempre que os decibéis subiam acima do limite estabelecido pelos mosteiros na Idade Média, e transitado para a casa onde estamos em Paço de Arcos. Ao que parece os gatos gostam pouco de mudanças e ficam stressados quando os obrigamos a conhecer um novo ambiente. Não gostar de mudanças eu compreendo, agora ficar passado dos carretos por ter abandonado Benfica onde o conceito de dar os bons dias ao vizinho era escarrar-lhe na cara e urinar-lhe na caixa de correio, já me parece um pouco absurdo. Eu tentei dar-lhe algumas sessões de psicanálise mas como sou contra bater em animais desisti quando acabei por lhe partir uma vassoura no lombo. Os anti-depressivos foram o estágio seguinte, receitados pela veterinária que, mesmo tendo uma arma apontada à cabeça, conseguiu manter a calma e apresentar uma caligrafia perceptível. Portanto, aqueles que dizem que a "letra de médico é ilegível" deviam era calar o bico.

5.
Porque é que duas das perguntas que me assombram remetem ao passado e as outras duas ao presente?

Por razão nenhuma em especial... Estou é a trabalhar demais e, embora agora esteja de férias, continuo a acordar cedo para tratar de assuntos da casa e a bulir sempre que paro. Portanto, neste momento no meu cérebro não há passado nem futuro, há é uma grande bola de cenas, tipo uma miga alentejana gigante, onde se mescla informação. Agora, como é que isto se organiza já é outro assunto completamente diferente para o qual era necessário criar um departamento próprio. Para isso e para o chinês do Futre, que o episódio não está esquecido. Mas lá iremos que isto tem de ser uma coisa de cada vez. Mais uma ou duas semanas, dizem eles, já estarei na nova morada. E depois tudo será diferente. Ou não...

Friday, May 20, 2011

O MUNDO VAI ACABAR... e eu não tenho roupa decente para vestir!

Ora então parece que hoje, dia 21 de Maio de 2011, é o Dia do Juízo Final.
Digo isto mas atenção que não é o fim do mundo... Esse vai ser uns meses depois, no dia 21 de Outubro!

O Juízo Final é só uma espécie de ordem de despejo que vamos receber do senhorio-mor (para quem é burro e não percebe metáforas, estou a falar de Deus). Senhorio esse que, escusado será dizer, está farto de ouvir o disco do Toy que pomos a tocar em altos berros às tantas da madrugada, dia após dia desde há milhares de anos. Os últimos que fizeram isso têm agora as ossadas a apanhar pó em museus como o da Lourinhã e enfeitam a maior parte das lancheiras dos miúdos do ensino primário (uma vez mais a metáfora, burros do catano, falo de dinossauros). A grande verdade é que andamos há demasiado tempo a f***r de cima abaixo este T2+1 a que chamamos Planeta Terra. E por isso não O condeno. Se fosse eu o dono disto tinha corrido com esta cambada logo na semana 1. Era ver o primeiro macaco a desenhar uma cabra em Foz Côa e levavam todos um chuto no cu dali p'ra fora por vandalismo...

Bom, quando vi na net a notícia de que hoje (mais logo, espero eu) as almas seriam julgadas e basicamente seria separado o trigo do joio, a minha reacção foi espontânea e imediata... Qualquer coisa como: "Atenção que também eu fiquei triste com o facto do Benfica ter ganho apenas uma mísera, e ranhosa se me permitem acrescentar, Taça da Liga, mas ficar tão desgostoso ao ponto de começar a apregoar o Fim dos Tempos parece-me um bocado extremo. Para o ano o Jesus compra mais cinco argentinos e a coisa resolve-se..."

No entanto, ao ler um artigo do Semanário Sol, reparei na frase inicial que rezava o seguinte: "Um movimento cristão norte-americano anunciou o 'fim do mundo' para 21 de Maio próximo, um ano e meio mais cedo do que a data 'prevista' pelo calendário maia: 21 de Dezembro de 2012 (...)"

Aqui, toda a minha perspectiva mudou de imediato.

Em primeiro lugar, se é um movimento cristão a dizer é porque é com certeza verdade.

Então norte-americano é a cereja no topo do bolo no que diz respeito a malta que não saberia mentir mesmo que quisesse. Isso e ninguém melhor do que indivíduos que acham que Portugal é um resort na Riviera Maya para dizer com exactidão uma coisa que nem o mais sábio dos sábios soube algum dia anunciar.

Mas há uma coisa que irrita no meio desta história toda. Os americanos têm sempre de ser os primeiros em tudo. Foram os primeiros a fazer de conta que foram à Lua, os primeiros a chamar desporto a um bando de bisontes com capacetes a correr agarrados a um melão e agora tiveram de roubar o protagonismo aos desgraçados dos índios (como se não bastasse todo o mal que lhes fizeram no passado) e anunciar o Fim do Mundo para um ano antes.

Além do mais é falta de consideração à minha pessoa. Ando eu a preparar-me física e psicologicamente para acabar em grande estilo em 2012, a treinar números de sapateado e a ver espectáculos do La Féria de enfiada, e agora tenho de antecipar todo um programa de festas porque os meninos querem ser eles a dizer quando é que acaba e quando é que não acaba.

Canalhas!

Ah e o dia do Juízo Final hoje também é uma rica prenda, sim senhor.
Penso que consiste num princípio muito básico: quem for crente é sugado pelos céus a grande velocidade.

...

Peço desculpa, mas não há maneira menos idiota de explicar isto.

...

As pessoas boas vão voar todas na vertical como se tivessem um míssil enfiado no rabo... E aquelas que estiverem dentro de casa suponho que, além de ficarem surpresas pelo súbito chamamento divino, também levarão com uma carrada de estuque emplastrada na testa que não será brincadeira. Mas enfim, serão salvas. E não é para isso que vivemos?

Já os outros ficarão aqui a ser julgados.
E o facto de eu quase de certeza me inserir nesse grupo deixa-me deveras inquieto.

É que a minha casa está em obras e eu tenho grande parte dos meus pertences em caixas de cartão. Significa que as minhas melhores roupas estão guardadas e não tenho nada decente para levar a tribunal. Já gente para me defender não estou minimamente preocupado, porque com o resgate das boas almas e a permanência de todas as más o que não deve faltar p'raí são juízes e advogados à procura de uma oportunidade. Agora, sem um fatinho minimamente como deve ser prefiro ficar em casa e fazer um requerimento por escrito para ser julgado noutra altura... Enfim, não me convinha nada estar com este tipo de problemas agora, francamente.

De qualquer maneira, até fico agradecido a mim próprio por pertencer à turma dos condenados. É que eu tenho um terrível problema de vertigens e se me sacassem por aí acima era bem capaz de me dar uma síncope antes de chegar às portas douradas de São Pedro. Isso ou despedir-me deste mundo de forma inglória e até vergonhosa, borrando-me vigorosamente pelos céus acima... Assim, posso ficar mal acompanhado com os outros bandalhos todos mas ao menos tenhos os pézinhos na terra.

Terminado o Juízo Final, calculo que no telejornal das 20h já saiam os primeiros resultados: quem foi, quem não foi, quem arderá no inferno eternamente, quem absolveu o Pinto da Costa... Ao menos espero que não faltem fofocas e mexericos até Outubro quando é suposto irmos todos desta p'ra melhor.

Outubro esse que, convém dizê-lo, também é um péssimo mês para acabarem com isto. Ou ao menos façam-no depois das minhas férias que são durante esse mês. Seria terrível estar a bebericar cocktails em Havana ou na Fonte da Telha e vir um indivíduo trazer-me a conta e dizer-me para pagar depressa porque o estabelecimento vai fechar e o mundo também. Não sei quanto aos outros, mas eu ando a trabalhar o ano inteiro como um cão e isto custar-me-ia muito ouvir.

Enfim, agora já não há muito a fazer...
Tinha coisas combinadas para o Natal deste ano e para Janeiro de 2012 e vou ter de desmarcar tudo por causa do raio dos fanáticos religiosos! Não há quem lhes enfie duas murraças na tromba e aplique um rotativo à Van Damme. Depois disso o Fim do Mundo já não lhes pareceria tão mau.

Quanto a mim, o que tiver de vir virá.
Pelo sim pelo não o melhor é continuar a escovar os dentes porque as cáries não são bichezas para terem medo cá de Apocalipses... O melhor é ir vivendo e ter juízo...

...

... Final!

(risos e aplausos)

Thursday, April 28, 2011

62 Considerações acerca dos últimos dias

Eu fiz parte do grosso magote de pessoas que decidiram aproveitar as mini-férias da Páscoa para ir desopilar por aí...

Primeiro porque se é para desopilar, aqui o menino desopila sempre em grande estilo. Depois porque com os FMI's a dar-nos na pá, o Benfica a levar na pá e o stress do dia-a-dia a esgotar-me a pá (não tenho bem a certeza do que isto quer dizer mas agora está dito está dito)... Estava mesmo a precisar de me pôr a milhas desta trapalhada toda.

Assim, tenho obviamente considerações a tecer acerca dos últimos dias, da viagem e não só. E vai em jeito de lista que isto tudo misturado não dá texto nenhum que se preze...

É assim...


- Faço-me à estrada logo na noite da 5ª feira, depois do trabalho. Isto enquanto parece que Deus está determinado a afogar a Terra em chuva só para se entreter.

- Cago na chuva porque me rio na cara do perigo e, sempre que posso, efectuo valentes manguitos aos maricas que decidem esperar pela manhã seguinte para fazer a viagem em segurança...

- Antes de ir, janto num restaurante ao pé de casa e, perante a incapacidade da minha mulher em comer dois dos bifes de perú da sua travessa, peço para os levar embrulhados na esperança de encontrar um cãozinho abandonado e faminto mais tarde.

- A empregada do restaurante fica claramente a pensar que os bifes são p'ra mim e que eu sou deprimente... Mas no fundo ela é que serve à mesa num restaurante manhoso e não eu.

- Sendo que vou eu a conduzir, a minha mulher acha boa ideia levar os bifes no banco de trás ao invés de os colocar na bagageira.

- O que, aliado ao facto de não podermos abrir as janelas por causa da chuva, abençoa a viagem com o sempre inebriante e agradável pivete a alho.

- O destino: Zambujeira do Mar. O condutor: eu. O que é que isto está a pedir? Sarilho, evidentemente.

- Depois de andarmos perdidos durante uma série de quilómetros, chegando a Odemira vemos a estrada cortada porque... sim.

- Se era boa ideia colocar um aviso uma meia hora atrás: ERA! Mas não era a mesma coisa porque assim não andávamos nós às voltas no Alentejo profundo de madrugada...

- Chove na Zambujeira. Não conseguimos deixar de antever os belos dias de praia que nos esperam.

- Cães abandonados e famintos nem vê-los. Deixamos os bifes na bagageira do carro e vamos dormir.

- Dilúvio até de manhã!

- Dia 2: o tempo está rafeiro mas já se aguenta melhor. A TV só tem os canais nacionais, o que me permite assistir a uma inteligente conversa entre Manuel Luís Goucha, Cinha Jardim, Lili Caneças e outra velha que nunca vi mais gorda. O ponto alto é quando esta última diz a palavra "merda" gratuitamente. O público ri e aplaude.

- Assim, depois de vomitar o pequeno almoço, faço uma visita de reconhecimento pela Zambujeira.

- Não há cães abandonados.

- Nem famintos, tão pouco.

- Ainda assim, vamos resgatar os bifes à bagageira do carro e dirigimo-nos para a zona da praia com a intenção de almoçar.

- No final da refeição, reparamos que o vinho não vem na conta.

- O meu primeiro pensamento é de que se trata de cortesia da casa, dado que sou uma celebridade.

- O meu segundo pensamento é que confundo muitas vezes o conceito de celebridade com o de palerma e, como tal, continua a não haver razão para a porra do vinho não estar na conta.

- Porque inegavelmente sou um palerma, alerto para o lapso.

- Pedem-me desculpas (?????) e acrescentam o valor à conta.

- Pago e vou-me embora. Com o almoço a bailar-me no estômago ainda por causa do programa da manhã da TVI...

- Uns metros à frente a minha mulher apercebe-se que deixou os bifes embrulhados na mesa do restaurante.

- Dá-me um valente chilique derivado da vergonha e, entre guinchos animalescos e espasmos musculares, fujo para longe.

- Portanto, o que se passou foi o seguinte: não só chamei à atenção por não ter pago o suficiente como ainda lhes deixei dois bifes para abater na despesa. No que toca a restaurantes, sou um cliente de sonho.

- Mesmo não estando tempo para isso, vamos até à praia e deitamo-nos na areia.

- Para saltar dali minutos mais tarde porque começa a chover outra vez.

- No entanto, o breve contacto entre os nossos casacos e a areia húmida é o suficiente para os deixar para o resto das férias com o fétido aroma a urina de qualquer ser que não o humano.

- Coisa que não contribui para a nossa popularidade nos restantes dias.

- À noite, vejo pela primeira vez o "Portugal tem Talento" e logo a grande final.

- Bárbara Guimarães entra em palco mascarada de Lady Gaga e participa numa interessante e exótica coreografia.

- Quanto a isto, dois aspectos: a mulher apresenta sinais inquestionáveis de insanidade e alguém lhe devia dizer que fazer playback com a boca p'ró lado não é sexy... é sinal de que se teve um AVC.

- Dilúvio até de manhã!

- Apercebo-me que o filho mais velho da falecida princesa Diana se vai casar porque não se fala de outra coisa na TV.

- Constato que o puto tem melhor gosto para as mulheres do que o pai, que por livre e espontânea vontade entregou o coração a um estafermo que parece ter apanhado com uma betoneira em cheio no trombil.

- Lembro-me que o Carlos e a Diana eram um casal intrigante. Ela confessou tê-lo traído com alguns tipos, nomeadamente militares. Ele enganou-a repetidas vezes com aquele aborto mal parido de ogre e, mais tarde e já viúvo, até casou com a criatura.

- Portanto, na minha maneira de ver as coisas, há um nome para cada um. Princesa Diana: adúltera. Príncipe Carlos: maluco dos cornos!

- Mas pronto, o filho agora, e apesar de estar a ficar careca, diz que vai casar-se muito em breve. E parece que um dos enviados especiais da TVI a Londres para fazer a cobertura do acontecimento vai ser Manuel Luís Goucha.

- A TVI arrisca-se assim a nunca mais poder pisar solo inglês... Mas admiro a iniciativa e a coragem.

- Além de boa televisão, os dias que se seguem trazem também boa comida.

- Falo de migas com entrecosto, salada de polvo, choquinhos fritos e feijoada de búzios.

- Falo também do bom e velho Guronsan para ajudar a digerir estas zurrapas.

- O Benfica ganha a Taça da Liga o que, para ser sincero, não me faz assim grande diferença. É só mais um tareco para eles lá terem a apanhar pó. E ainda por cima a taça é preta, onde se nota ainda mais a sujidade.

- Se fosse eu, quando fosse jantar depois do jogo deixava-a no restaurante como deixei os bifes. Sempre era menos uma coisa a empatar.

- Sei que estou a ser mau, que é sempre melhor ganhar do que perder. Mas depois do desaire na Taça de Portugal permitam-me o direito à crueldade.

- Os díluvios amainam... No dia do regresso está um maravilhoso sol de Verão.

- Fico emocionado pela forma engalanada como a vila decide despedir-se de mim. Tanto que me apetece lá detonar uma bomba como agradecimento.

- Tenho ainda tempo de ver a actriz Guida Maria a interromper uma das suas peças dedicadas à vagina e a deslocar-se a um estúdio de televisão para comentar a actualidade.

- Constato pela primeira vez que prefiro ver uma mulher de 50 anos a falar de orgãos sexuais do que a exprimir opiniões...

- Aparentemente quando não está a falar com ou de vaginas, Guida Maria está a dizer merda.

- Estava consternada por ver tanta gente a ir de férias, a rumar ao Sul, em tempos de crise. "Parece que a crise afinal é só em minha casa", exclamava ela em tom esganiçado.

- Melhor seria se as pessoas ficassem todas em casa a contar os tostões, não gastassem dinheiro nenhum e a nossa economia estagnasse... Isso é que era de valor.

- Mas no fundo sou obrigado a concordar com ela. Este ponto de vista prova que há de facto uma crise intelectual que reina em sua casa... Já vaginas há com fartura e ainda bem, que o bom teatro não vive sem elas.

- Ainda cedo, para não apanhar trânsito, o regresso...

- É a vez da minha mulher assumir o volante. Tudo corre bem até passarmos por alguns campos de pasto onde se encontram vacas.

- A minha mulher adora bichos. Fica embevecida a olhar p'ra eles...

- P'ra eles e não p'rá estrada, onde se dirige a grande velocidade na direcção de um veículo parado.

- Berro como se estivesse a dar à luz.

- Os meus olhos do tamanho de pratos de sobremesa.

- Ela apercebe-se a tempo de evitar o nosso falecimento.

- E é encharcado em urina que regresso a casa duas horas e picos depois.


FIM

Monday, April 11, 2011

Eu por outros lados


Então não é que em amena passeata pelo mundo da internet fui dar com um boneco da autoria da minha amiga ilustradora e muito talentosa artista Mariana Perry, a partir do meu último texto "Eu por cá"?

Bem verdade, sim senhor. Muito lhe agradeço a gentileza.

Retribuo com um elogio ('Tá do catano, Mariana!) e com alguma publicidade ao seu excelente trabalho. Checkem o seu blogue de ilustração, o de BD e o Behance. É do melhor!

Saturday, April 9, 2011

Eu por cá

Enquanto escrevo estas linhas o meu amor está provavelmente a passar momentos inolvidáveis de diversão infantil na Eurodisney...

Sim, aquela que fica em Paris de França.
Na empresa onde ela trabalha acharam que era boa ideia comemorar o aniversário levando toda a gente para lá... E, até aí, estou plenamente de acordo. Acho que é de valor.

Só que às vezes bate aquela saudade...
Parece que foi ontem que a senti partir de madrugada para esse pássaro alado com penugem de metal a quem as pessoas civilizadas chamam de avião. E sim, parabéns àqueles que detectaram a piada fácil, foi mesmo ontem.

No meu coração parece que foi há mais tempo, tal é o sentimento que nutro por esta mulher.
Em momentos como este apetece-me encher o peito de ar, correr como doido até à janela aqui de casa, abri-la com um empurrão animalesco e gritar a plenos pulmões:

- O QUE É QUE EU COMO?!

...

...

É, que... E, por favor, não me interpretem mal que eu não sou nada machista... Sou é muito pouco hábil no que diz respeito à nobre arte da culinária. É certo que já fui mais esforçado no passado, não vou negar isso, mas a minha tendência natural para a trapalhice numa actividade que incide num sentido tão picuinhas como o paladar, esta minha coordenação motora digna de um cabeçudo do Carnaval de Torres revela-se um verdadeiro desastre. Relembro com algum saudosismo os telefonemas que fazia à minha avó na busca abnegada por receitas, dicas, qualquer coisa que me fizesse mostrar a porra de um lado sensível à minha mulher e assim convencê-la a ficar comigo!!!

Mas as coisas nem sempre corriam bem... Aliás, raramente...
Uma das vezes, a minha querida avó ensinou-me via telefone a fazer bifes marinados em vinho tinto. E eu, bruto que nem uma bigorna de vinte toneladas, lá fui à garrafeira de casa dos meus pais e fiz tal e qual ela me tinha instruído. Apenas na altura em que a minha cara-metade se queixou que os bifes tinham um sabor estranho eu comecei a desconfiar de que algo de errado se passava com eles.

Na verdade, não tinham um sabor nada estranho... Se esse sabor pertencesse a um torrão de Alicante encharcado em caramelo!

Estavam doces como tudo.
E o mistério foi rapidamente solucionado quando percebi que não tinha sido com vinho que tinha marinado o raio dos bifes... mas sim com jeropiga.

O resultado não é tão brilhante quanto possam pensar...

Mas sem querer assumir o erro, forcei-nos a acabar a refeição dizendo que era exactamente aquilo que queria fazer e que o sabor agridoce dos bifes (mais doce do que agri é certo) era fruto de uma receita exótica que eu tinha querido experimentar.

Graças a Deus que havia guronsan disponível na caixa dos medicamentos porque as horas que se seguiram foram tudo menos agradáveis...

A partir daí tanto eu como ela percebemos que há tarefas para as quais definitivamente não sou talhado. Ela é dotada de um talento mais do que razoável para a cozinha. Eu sou excepcionalmente bom a espojar-me no sofá e a jogar playstation. Não são tarefas fáceis mas alguém tem de as fazer.

Por essas e por outras ela faz-me falta.
Mas não deixo de me sentir contente por saber que se está a divertir. Isto embora eu também não esteja nada mal servido aqui em Paço de Arcos...

A Eurodisney tem um rato.
E eu só cá em casa tenho uma gata e uma coelha.
Portanto, em bichezas de orelhas proeminentes já estou a ganhar.

Lá, têm o Pato Donald.
E aqui à volta há pombaria que nunca mais acaba.
Não se vestem à marinheiro mas cagam os prédios como se fizessem parte das tropas especiais. Também aí está ela por ela.

Finalmente, parece que também há por lá a montanha russa do Indiana Jones.
E eu aqui perto tenho o SATU do Oeiras Parque.
Pronto, aí tenho de dar o braço a torcer... Adrenalina é coisa que não abunda naquela carruagem. Mas ao menos vou mais à larga porque aquilo está sempre vazio. Por isso acaba por compensar.

Enfim, ela por lá e eu por cá com todas as minhas limitações.
Limitações essas que não são assim tantas... É importante deixar aqui bem explícito que não preciso da ajuda de ninguém para me vestir ou para tomar banho. Isto embora há quem diga que não me fazia falta nenhuma uma mãozinha na hora de escolher os trapos que ostento no corpo, no dia-a-dia, dada a combinação de cores e de tecidos. O que para mim é avant-garde para os outros é apenas bizarro. Eu bem tento explicar que todos os grandes génios sofreram no seu tempo e que se calhar as gerações vindouras ainda hão-de dar-me razão mas nem eu próprio acredito muito nisso... É apenas algo que digo.

No fundo, e a ausência da minha mulher faz-me compreender isso, sou como um porquinho-da-índia que não deve ser deixado sozinho sem ração na tigela nem água no bebedouro. Portanto, se algo me acontecer entretanto, se começar a ficar com o pêlo pouco sedoso ou com os incisivos a lascar a culpa é dela e só dela!

Pelo sim pelo não, vou dedicar o dia de amanhã a roer-lhe os objectos de uso pessoal.

Aposto que tão cedo não repete a gracinha...

Sunday, March 27, 2011

Escolhas da treta

A vida é feita de escolhas, lá diz o cliché.
Atenção que não estou a referir-me a um indivíduo francês com esse nome, mas sim ao lugar comum, a um conceito batidíssimo que se faz repetir há anos e anos.

Mas a vida é, de facto, feita de escolhas.
E eu, com impressionante recorrência, escolho mal.

Não digo sempre, há alturas em que acerto como no dia em que escolhi a mulher com quem partilho a vida ou no momento em que achei que era rabichola ter demasiado cabelo e optei pela calvície. Em ambas as situações, considero que movi a peça certa do xadrez.

No entanto, não consigo lembrar-me do número absurdo de vezes que, tendo perante mim um quadro de 50/50, optei pelo resultado que se revelou mais catastrófico. Exemplos concretos, existem e muitos. Mas eu prefiro relatar os dois que estão mais fresquinhos...

Quanto ao primeiro, estava eu a ver TV no sossego do meu lar...
Ok, esqueçam esta última parte porque no meu lar raramente há disso. A ideia mais realista que tenho de sossego entre quatro paredes é quando a gata está tão exausta de me f***r o juízo que jaz inerte, de patas voltadas e olhos abertos, ofegante como uma bomba de tirar água, a recuperar o fôlego antes de me voltar a azucrinar o juízo até ao limiar da insanidade. São esses quinze minutos diários aqueles que compõem a minha ideia de... sossego.

Mas pronto, num desses deliciosos intervalos vi um anúncio que promovia a nova cerveja Sagres Preta com sabor a chocolate.

Que imensa idiotice, pensei eu.

Que brutal atrocidade, reflecti.

QUE BESTIAL MARAVILHA QUE TENHO DE SABOREAR O QUANTO ANTES, concluí!!!

Pois é, na verdade eu sou como as avestruzes. Adoro coisas brilhantes e raras são as vezes que não vou lá meter o bico. Além disso, há quem diga que entre mim e os apalermados passarocos, o cérebrozinho é de tamanho idêntico. E às pessoas que dizem isso está prometida uma bicada nos cornos.

Adiante...
Depois do momento divino em que visualizei a publicidade à cerveja, contaram-se pelos dedos de uma mão os segundos que demorei a sorver às goladas o misterioso néctar.

Foi logo na próxima sessão de compras semanal com a minha mulher, já estávamos nós na caixa a meter as mercearias nos sacos quando me lembrei do importante item em falta e dei uma corrida até aos escaparates das cervejas. Surgi com um pack de seis, sorridente e feliz da vida. Disse que não podia esperar muito mais para provar o tesourinho.

"Olhe que pode levar só uma garrafa... Se é só para provar...", disse a senhora da caixa, deixando fluir a voz da experiência.

" Não senhora, que depois aproveito e partilho com amigos...", disse eu, confiante da minha escolha.

...

Experimentei.

E sou agora capaz de declarar...

... com toda a legitimidade e conhecimento de causa...

... que é talvez a MIXÓRDIA MAIS MAL SABOROSA QUE JÁ ALGUMA VEZ ME PASSOU PELA TRAQUEIA!!!

...

Atenção que eu não posso comprovar em absoluto a seguinte comparação.
Mas o sabor desta beberragem será apenas comparável ao da URINA INFECTADA DE UM ALCOÓLICO DIABÉTICO!

Tem álcool... Tem um travo a cerveja... É doce... Tem um travo a chocolate... É horrível... Tem um travo a fezes...

E agora tenho aqui mais cinco garrafas destas no frigorífico sem que ninguém no seu perfeito juízo lhes queira pegar! Não vou oferecer isto a amigo nenhum porque seria o equivalente a oferecer-lhe o quisto lancetado de um morcego: é fedorento e não serve para nada. Mas, ao mesmo tempo, esta porcaria custou dinheiro e custa-me enfiá-la assim no lixo sem mais nem menos...

Enfim, cruel dilema.

Mas não tão cruel como o jantar de ontem.

Ok, agora as pessoas mais maldosas dirão "este agora pensa que, depois do que aconteceu com o Barra do Quanza, basta vir falar de restaurantes p'ró blogue para que tudo se resolva de maneira airosa e receba convites simpáticos para jantar à pala"...

Pessoas maldosas, atentem nas minhas palavras:

EU NÃO VOLTO A ESTE RESTAURANTE NEM QUE ME SIRVAM SUSHI ENROLADO EM NOTAS DE QUINHENTOS, COM A JESSICA ALBA A MASSAJAR-ME OS PÉS COM ÓLEO JOHNSON E A CHAMAR-ME "COMANDANTE", OK?!

Nem pó!

Passou-se o seguinte: ontem, depois de um evento, fui jantar com amigos. Como éramos muitos, e estávamos na zona da Avenida da Liberdade, sugeri que fossemos ao restaurante Indian Palace no Largo do Carmo. Não que o restaurante seja nada por aí além mas era o único que estava a ver acolher um grupo tão grande assim sem marcação prévia. Portanto, fiz a minha escolha e transmiti-a aos meus camaradas, colocando assim a cabeça no cadafalso.

Lá fomos e lá entrámos. E o início até nem fazia augurar nada de muito mau... apenas dez minutos até que nos sentassem. A malta ria e partilhava, bem disposta, que já tinha apetite. A malta desconhecia aquilo para que estava guardada.

As ementas demoraram mais de meia hora a vir. À terceira vez que perguntei por elas, disse-me o indivíduo que "estavam ocupadas". Aí, eu acalmei e percebi tudo. Para quem não sabe, ser ementa não é para todos, é uma ocupação exigente. Uma vez estive junto a uma ementa durante quinze minutos e não imaginam o número de telefonemas e de mails que ela recebeu, isto enquanto fazia a contabilidade de um sujeito de Odivelas e elaborava o programa de um grupo excursionista da Amora. Portanto, constata-se por este exemplo que "ementas ocupadas" é o que p'raí mais há.

Depois de três imperiais no bucho e de parte dos sorrisos já ter abandonado as faces da malta... lá vieram meia dúzia de ementas todas ao mesmo tempo. Isto enquanto os empregados corriam literalmente para a frente e para trás como se fosse hora de ponta em Bombaim ou o final de um filme de Bollywood. Eu já não sabia se havia de escolher o jantar ou de aplaudir o espectáculo.

Mas, enfim... Escolhemos, pedimos e...

... esperámos até perto da MEIA NOITE para começar a comer.

...

Meia noite.

Das duas uma: ou o serviço é mau ou esperaram que fosse nove da noite na Índia para servir a nossa refeição. De qualquer das formas, foi importante para nós comermos ao mesmo tempo de um qualquer estofador chamado Sangita... Depois ficámos foi com jet lag.

Outra das razões do atraso devia ser o método de lavagem da loiça, porque pelo estado encardido dos pratos sou forçado a acreditar que os mesmo foram lavados no Ganges. Por isso, isto de andar sempre com sacas cheias de loiça para os aviões, p'raqui e p'rali, deve levar o seu tempo... Enfim, ca nojo.

Já a mastigar, por entre uma garfada ou outra, ainda tivemos de lutar com um tipo que queria à força vender-nos uns óculos de plástico roxo que davam luzes das hastes. Não foi tarefa fácil.
Sedentos de alimento e dada a ausência de colheres, todos raspávamos sôfregamente com os garfos as pequenas malgas de molhenga que constituía o nosso jantar.

Todos? Não.

Um dos nossos amigos resistia ainda e sempre ao invasor... Ou seja, o prato dele demorou extra-tempo a chegar e quando chegou veio com outro nome e com outros ingredientes completamente diferentes do pedido original. Marchou, tal era a fome. Mas só marchou metade porque a cena tinha mais picante do que a Cicciolina quando se orientou com o cavalo... Apenas deu para enganar a larica.

No final, como se a minha escolha de restaurante não tivesse sido já suficientemente negra ainda houve improviso e discussão porque o tal prato que não veio diziam os indianos que veio e o que veio, e que quase rebentara as gengivas do nosso amigo à base de piri-piri, ao que parece também continha borrego e era caro como cornos.

Ainda tivemos de ver o indiano apontar para o nosso amigo e gritar "BORREGO!" em plenos pulmões como se nós estivessemos a negar que ele o tivesse comido... Um insulto que poderia muito bem ter dado início a um verdadeiro conflito "a la Martim Moniz".

Apenas quando uns de nós começaram a perder a cabeça e ameaçaram pedir o livro de reclamações os ânimos serenaram e foi tudo para casa com fome mas sem ter sido demasiado roubado...

...

Enfim, "cerveja preta com chocolate" e "Indian Palace"... Duas escolhas erradas que podiam muito bem servir-me de lição mas que, sei bem, serão apenas mais duas achas para a lareira na qual arderei eternamente.

By the way, diz que dou uma bonita chama.

E que com um cházinho e uma mantinha nos joelhos, proporciono momentos muito zen.

Valha-nos isso.